NPE 01: Dos pobres para os paupérrimos ou dos mais ricos para os mais pobres? O impacto sobre a desigualdade de diferentes formas de expansão das transferências de renda no Brasil

A pre­sen­te Nota exa­mi­nou o impac­to dos atu­ais pro­gra­mas de trans­fe­rên­cia e impos­tos sobre ren­da e patrimô­nio para os dife­ren­tes estra­tos da dis­tri­bui­ção de ren­da no Bra­sil e simu­lou o efei­to sobre a desi­gual­da­de das pro­pos­tas ela­bo­ra­das pela equi­pe do gover­no e de outras pro­pos­tas de ren­da míni­ma finan­ci­a­das pelo aumen­to na tri­bu­ta­ção sobre as ren­das mais altas do Bra­sil. Os dados da Pes­qui­sa de Orça­men­tos Fami­li­a­res (POF) de 2017–2018 demons­tram que, atu­al­men­te, as trans­fe­rên­ci­as mone­tá­ri­as do gover­no são as prin­ci­pais res­pon­sá­veis pela redu­ção das desi­gual­da­des via polí­ti­ca fis­cal. A tri­bu­ta­ção dire­ta con­tri­bui para isso de manei­ra mui­to tími­da, e há espa­ço para melho­ras em seu poder redistributivo.

Con­si­de­ran­do o limi­te impos­to pelo teto de gas­tos, que dei­xa um espa­ço cada vez menor para as des­pe­sas “não obri­ga­tó­ri­as” no Orça­men­to, as pri­mei­ras pro­pos­tas da equi­pe do gover­no para finan­ci­ar a expan­são do Pro­gra­ma Bol­sa Famí­lia se base­a­vam na revi­são de bene­fí­ci­os soci­ais já exis­ten­tes, como o Abo­no Sala­ri­al e o Segu­ro Defe­so. Outras pro­pos­tas apre­sen­ta­ram como con­tra­par­ti­da fis­cal a desin­de­xa­ção do salá­rio míni­mo da taxa de infla­ção, o que impli­ca­ria numa que­da real do valor do piso das apo­sen­ta­do­ri­as e outras trans­fe­rên­ci­as, ou o con­ge­la­men­to do valor de todos os bene­fí­ci­os pre­vi­den­ciá­ri­os por dois anos. 

Nos­sas simu­la­ções suge­rem que rema­ne­jar recur­sos dos bene­fí­ci­os soci­ais já exis­ten­tes, rece­bi­dos pelos estra­tos inter­me­diá­ri­os de ren­da da popu­la­ção, impli­ca uma trans­fe­rên­cia de ren­da do meio para a base, man­ten­do essen­ci­al­men­te inal­te­ra­da a ren­da dos mais ricos. Na Pro­pos­ta 1, via subs­ti­tui­ção do abo­no sala­ri­al, segu­ro defe­so e salá­rio famí­lia, é pos­sí­vel ampli­ar em 30% o valor do bene­fí­cio médio do PBF e ampliá-lo em 3 milhões de bene­fi­ciá­ri­os. Nes­te caso, veri­fi­ca­mos que há mudan­ça no índi­ce de gini em rela­ção ao cená­rio base é pra­ti­ca­men­te nula (0,3%). Já a Pro­pos­ta 2, na qual o valor do salá­rio míni­mo e dos bene­fí­ci­os atre­la­dos sofrem cor­ro­são real por dois anos, é pos­sí­vel, além do aumen­to de 30% dos bene­fí­ci­os médi­os do PBF, alcan­çar novas 20 milhões de pes­so­as com o pro­gra­ma, sen­do a redu­ção do Gini, ain­da assim, qua­se nula, (0.8%), uma vez que a ren­da dos mais ricos per­ma­ne­ce inal­te­ra­da. Somen­te na Pro­pos­ta 3, em que se con­ge­lam os bene­fí­ci­os pre­vi­den­ciá­ri­os, a ren­da dos mais ricos sofre algu­ma alte­ra­ção, por con­ta da dis­tri­bui­ção do RGPS e RPPS. Nes­ta simu­la­ção, para além da ele­va­ção do bene­fí­cio médio equi­va­len­te às ante­ri­o­res, é pos­sí­vel incluir novas 56 milhões de pes­so­as a estes valo­res, impli­can­do em uma redu­ção de 2,3% do Gini.

Ana­li­san­do pro­pos­tas alter­na­ti­vas de ren­da míni­ma, a Nota suge­re que há espa­ço fis­cal para uma ampli­a­ção sig­ni­fi­ca­ti­va de pro­gra­mas de trans­fe­rên­cia de ren­da, des­de que a redis­tri­bui­ção ocor­ra dos estra­tos mais ricos para os mais pobres. O resul­ta­do de tais pro­pos­tas alter­na­ti­vas dei­xa cla­ro que, esta­be­le­cen­do-se uma tri­bu­ta­ção mais pro­gres­si­va, é pos­sí­vel cri­ar pro­gra­mas de trans­fe­rên­cia mais robus­tos, bene­fi­ci­an­do os 30% ou 50% mais pobres com valo­res subs­tan­ci­al­men­te mai­o­res que os atu­ais. A mais abran­gen­te delas asse­gu­ra uma trans­fe­rên­cia de R$ 125 para todos os bra­si­lei­ros da meta­de mais pobre da popu­la­ção, o que redu­zi­ria em 8,9% o índi­ce de Gini. Para finan­ci­ar essa rede de pro­te­ção soci­al, os dados indi­cam que há espa­ço para aumen­tar a arre­ca­da­ção bra­si­lei­ra via Impos­to de Ren­da de Pes­soa Físi­ca, uma vez que se tra­ta de um impos­to pro­gres­si­vo, com ele­va­do poten­ci­al arre­ca­da­tó­rio e com espa­ço de ampli­a­ção da alí­quo­ta efe­ti­va, espe­ci­al­men­te entre o 1% mais rico da população.